Lá pelo ano de 1995 a editora espanhola Del Prado lançava nas bancas brasileiras uma coleção de encartes de música erudita. Eram 78 volumes, cada volume acompanhava um CD de áudio e consistia em algumas páginas do que, ao final, formariam 3 livros encadernados. As capas duras vinham também, em alguns volumes específicos. Na época, eu estava na faculdade e a pouca grana que eu ganhava na bolsa até que dava para encarar esta coleção. Então fui comprando os fascículos, que chegavam mais ou menos um por semana. Com o tempo, o tiozinho da banca até já deixava reservado meu exemplar. (Mesmo assim, perdi dois volumes quase no fim da coleção, dois de Mozart... que tristeza).
Coloquei como objetivo pessoal que eu leria o texto de cada fascículo e ouviria o respectivo CD com a devida atenção. Na época, eu já gostava de música erudita e até conhecia algumas obras e compositores, mas eu queria mesmo era ampliar meus horizontes.
Foi assim que ouvi pela primeira vez a música de Anton Bruckner.
A única obra dele que veio naquela coleção foi a Sinfonia n.4, a "Romântica". Lembro-me como se fosse ontem: comecei a ouvir e não consegui chegar ao final do CD. Na época não gostei, não suportei, mas sabia direito o motivo. Simplesmente meu ouvido não estava preparado para ouvir tal coisa. Hoje lembro disto como uma clara demonstração de que, na vida, a gente vai amadurecendo e aprendendo a gostar de obras que antes não seriam digeridas. Tudo ao seu tempo. Não preciso nem dizer que aquele CD é hoje um dos meus preferidos da coleção.
Ao longo de sua vida, Bruckner compôs missas, motetos, peças para órgão (instrumento no qual era exímio improvisador), mas o ponto alto deste compositor austríaco foram, sem dúvida, suas sinfonias. Nove ao total, assim como Beethoven, só que a nona de Bruckner ficou inacabada, com sua morte em Viena, 1896). E assim como Beethoven, Bruckner vivia um tanto sozinho e não tinha lá muitos amigos. Em sua época, depois de ser massacrado por muitas críticas, o reconhecimento e o sucesso vieram mesmo com a Sinfonia n.4 e a partir dela, uma sucessão de obras-primas. Era um compositor introspectivo, perfeccionista, auto-didata e sempre imerso em uma ansiedade e insegurança no que dizia respeito ao seu reconhecimento como artista. Tanto que, em 1867, acabou tendo um esgotamento nervoso e foi parar num sanatório.
No video abaixo, você pode conferir uma entrevista com Simon Rattle (atual regente titular da Filarmônica de Berlim) sobre a Sinfonia n.4 de Bruckner, com trechos da sinfonia.
Não encontrei nenhuma execução realmente decente desta sinfonia no YouTube. Até tem algumas razoáveis, mas já ouvi melhores. No geral, as sinfonias de Bruckner não são muito fáceis de se encontrar, mas vale cada segundo de procura. Isto é uma das coisas interessantes na música erudita: a busca incansável pela melhor interpretação, por aquela execução que chega a ser maior do que a própria obra em si, que não se limita à leitura mecânica da partitura.
Recomendo sinceramente: ouça as sinfonias de Bruckner de uma forma decente, com qualidade de som e com dedicação. Não dá para apreciar Bruckner no formato MP3 de 128kbps com um fone vabagabundo no meio do trânsito. Para ter uma remotíssima noção do que eu estou falando, dá uma conferida no video abaixo como é o final da Sinfonia n.8 (o maestro é Lorin Maazel, diretor da Filarmônica de Nova Iorque):
Para saber mais, temos o interessante texto:
Anton Bruckner - o Bach do Romantismo
E também tem o livro de Lauro Machado Coelho, O menestrel de Deus - Vida e obra de Anton Bruckner. (ISBN-13: 9788560187188, da Editora Algol), uma ótima leitura.
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